quinta-feira, 2 de julho de 2020

O nascimento da I.



Este é o nosso relato.
Do parto sonhado por mim, desde que fui mãe pela primeira vez.
Do parto em que eu há muito acredito. Natural. Fisiológico.

A I. veio quando quis e trouxe consigo muito mais do que eu podia alguma vez imaginar!

É o relato de uma enfermeira parteira, ou especialista em saúde materna e obstétrica, porisso, desculpem, antes de mais a sua extensão e também alguns pormenores que vos possam parecem a mais, mas que a mim, como mulher e enfermeira me fazem todo o sentido.
Qualquer coisa, passem à frente no vídeo :P


Sexta à noite senti algumas contrações desde o jantar tardio até à meia-noite, uma da manhã, talvez...
A certa altura achei que devia avisar a nossa parteira. Mas também que bastava enviar uma mensagem.
Estávamos cá em casa, com os padrinhos do Simão e eu fui falando que estava a sentir contrações mas não era coisa que doesse. Só incómodo. Continuamos a conviver na boa. Arrumei a cozinha, siga… Ainda fomos de carro aos pastéis e afinal optámos pelas tartes de maçã do McDonalds :D

De noite passou. Até me levantei uma vez por causa da Bina e estava normal.
Por isso, de manhã, disse à Isabel (que tinha uma aula até às 13h) que estava tudo bem, que nós também tínhamos uma sessão fotográfica e ia dar tempo para tudo! ;)
Fui passear com a Bina, os 20 minutos do costume e, apesar de ter tido algumas contrações no caminho, não as achei diferentes do meu habitual.

Siga para uma sessão fotográfica de um aninho, planeada à última da hora!
O Simão ficou nos meus pais, conforme combinado para a sessão.

Andamos pelo Buçaco. Das 11h até perto das 13h.

Mesmo no final, já os pais estavam a limpar a miúda (fizemos o smash the cake), recomeçaram as contrações.
Sentei-me mas afinal tive que me levantar. Disse ao André que tinham começado e ele pegou no material todo e fomos andando até ao carro. Senti umas 3 ou 4 contrações que já não davam para continuar a caminhar normalmente. Tinha de parar, respirar, apoiar-me e toca a andar.

No carro, mandei mensagem à minha irmã a dizer que não íamos lá almoçar e também disse ao André para não irmos aos pais dele conforme tínhamos combinado uma hora ou duas antes...

Avisei a parteira Isabel por mensagem. "Começaram e estão a ficar mais fortes. Mal acabou a sessão... Vamos agora para casa". Eram 13h04

Uns 10 minutos depois a caminho de casa, senti umas coisas, pensei no rolhão mucoso e perguntei ao André se tinha alguma toalha no carro (nada!), logo depois, pus a mão por fora das calças e vi que era líquido amniótico.
Já o André vinha muito depressa... Eu de olhos fechados para me concentrar e não pensar em mais nada.

Nova mensagem para a Isabel: "rompeu" às 13h17.

A Isabel e a Inês vieram a voar e nós do Buçaco em direção a casa. O mais rápido possível.
As dores eram toleráveis mas bastante frequentes.
Consegui ligar para casa dos meus pais num intervalo e, felizmente, atendeu o meu pai, disse-lhe que o Simão ficava lá para a tarde e nada mais.
No carro, consegui mentalizar a respiração que aprendi nas aulas de yoga. Das ondas do mar. E vim bem.

Ao chegar a casa, saí o mais normal possível do carro porque os vizinhos estavam cá fora a entrar para o carro e mal entrei no prédio, tive de me pôr de 4 nas escadas.
Novo intervalo e fui o mais rápido que pude para a banheira, queria tirar calças e lavar-me. 
E de lá, só saí para a piscina.

Não liguei água para não gastar água quente. Fiquei quase sempre de gatas porque sempre que me levantava vinha logo outra contração e elas continuavam muito frequentes...

O André foi logo tratar da piscina. Não falamos, cada um fez aquilo que tinha de fazer no momento certo.

Em cada contração, comecei a fazer Aaaaaaa, apoiada na beira da banheira, agarrada à mangueira do chuveiro e volta e meia a pensar no barulho que a vizinha velha carrancuda estaria a ouvir.
Precisei vocalizar, não chegava a respiração e para o fim, era até bem alto e fazia eco na banheira... Mas acho que não gritei.

Toquei-me. Senti a cabeça e as contrações continuavam em força. A piscina estava a encher. Pedi ao André para ligar à Isabel. Elas vinham a uns 20 minutos de distância.
E a partir daí ficaram sempre em alta-voz e depois em videochamada. Não ouvia metade do que me diziam e respondia só de vez em quando, mas era o suficiente para me sentir mais acompanhada.

Tiveram receio de não chegar a tempo.
Eu só pensava "espera um pouco bebé" "tenho de ficar de 4 para atrasar isto".
Sabia que estava cada vez mais perto, não havia volta atrás, que podia acontecer ali mesmo na banheira, sozinha, mas eu precisava tanto do apoio delas...

O André começou a carregar no fundo das costas na contração. Era como me sentia melhor.

Entretanto ele lembrou-se de me sugerir passar para a piscina. E lá fui num instante.
Soube depois que o barulho que estava a fazer estava a ser difícil de tolerar para ele :D

Ao entrar na piscina, percebi logo que a água estava num nível muito baixo…
Tentei abrir mais as pernas e baixar a barriga, mas não me sentia bem nessa posição.
E eu precisava tanto de apoio no fundo das costas...
"André põe mais água. Nem que seja fria"
Eu não tinha frio. Até tinha transpirado na banheira. Só queria mais água.

Comecei a sentir puxes e acho que me toquei novamente. Mas a cabeça até estava mais ou menos em cima. Nunca percebi dilatação, nem me interessou explorar. Só tentei perceber a proximidade da cabeça.

As parteiras começaram a videochamada a uns 5 minutos de chegarem e assustaram-se porque me viram na piscina e já com alguma vontade de puxar.
Pediram ao André para deixar a porta do prédio e casa aberta.
Segundo a Isabel, a Inês, saiu do carro que ficou todo mal estacionado, ainda em andamento :D

Mal chegou, deu-me a mão e a partir daí percebi que precisava de estar sempre a dar a mão a alguém, além da pressão atrás, no fundo das costas.

A Inês lembrou-se que nós queríamos filmagens e começou a filmar.

(e eu não tive tempo para fazer a tarte de maçã, nem ligar a música, nem pôr as luzinhas e pendurar os mantras que tinha pintado toda contente uns dias antes)

As parteiras perceberam que a água estava baixa e disseram ao André para entrar para subir o nível da água. Ele estava ao pé de mim já a fazer pressão no sacro.
Já dentro de água continuou sempre. Mesmo no intervalo das contrações. Só me sentia bem assim.


Na piscina, sentia que estava perto mas, ao mesmo tempo, que nunca mais chegava a hora.
Tive momentos em que chorei. Não pela dor, mas porque talvez duvidasse da nossa capacidade ou simplesmente porque me vinha ao subconsciente o parto do Simão.
E também dormia ou descansava nos curtos períodos de intervalo.

Chorava uns segundos e calava-me. E puxava.
A determinada altura a Bina, lá fora, chorou comigo…
Esteve sempre calada. Não ladrou. Foi impecável. Mas sentiu e chorou comigo.

A Isabel e a Inês tentaram pôr mais água quente com tachos aquecidos na cozinha mas não houve tempo para muito mais... Entretanto tiraram a mangueira que continuava a encher já com água fria. Fui eu que disse "tirem isto daqui!"
Porque a dado momento, olhei para baixo e não me fazia sentido aquilo ali no sitio onde ia nascer o bebé.

Toquei-me novamente e percebi que tinha cabelo.
Na banheira pareceu-me que não.. (adoro bebés cabeludos!)

A Isabel que, logo que pôde, equipou-se melhor, ficou sempre junto a mim, sentada numa cadeira e depois em pé para eu ficar a suspender-me agarrada aos braços dela durante o puxe.


Senti arder. Penso que primeiro à frente e depois no rabo: o anel de fogo.
"Está a arder!"
Fui dizendo o que sentia porque as parteiras nunca me tocaram.
Eu fui a minha parteira.

Em certo momento estava meio irritada, talvez de pensar que nunca mais nascia ou manter as minhas dúvidas na nossa capacidade de parir/nascer e tentei com as mãos afastar os lábios. Só percebi isso porque vi no vídeo. Mas não sentia que estava a fazer grande coisa.

Entretanto a cabeça lá saiu.
Não consegui "respirar o bebé para fora" como aprendi com a Janeth Balaskas e a Núria Vives. Fiz mesmo força. Empurrei-a e senti os pés dela também a empurrar cá dentro.

A única coisa que posso apontar a mim mesma neste nascimento foi essa pressa no final.
Tive de meter lá as mãos!

Senti-lhe a cara cá fora e vi que tinha uma circular do cordão ao pescoço. Disse em voz alta, mas percebi logo que era larga.
Só aí a Isabel pôs as mãos na água e tirou o cordão. Disse-me depois, que o fez só para eu não estar com essa preocupação, mas que não era necessário. E eu sabia que não.

Entretanto, achei que estava a demorar a sair o resto do corpo e pedi-lhes ajuda. E não demorou nada, mas pronto. Cabeça de enfermeira moldada por anos de experiências assistidas, sempre com intervenção, em vez de deixar os bebés rodarem e saírem por eles.

"Ajudem-me!" Qualquer coisa do género. "Tirem o bebé".

Mas as parteiras esperaram.

E a bebé saiu e eu puxei-a logo para o meu colo e sentei-me. O André ao meu lado.
Um cordão muito comprido. Ficou logo branquinho.

Chorei. Muito. Em simultâneo com ela.
Agradeci muito ao André. Sem ele não era possível. Dei-lhe beijinhos.

Só depois vi que era uma menina.
Eu sabia cá dentro que era…

"Temos uma filha".
Senti necessidade de dizer em voz alta para acreditar.


Entretanto, as parteiras foram buscar uma toalha molhada em água quente porque a da piscina não estava à temperatura ideal...

Uns minutos depois acharam melhor ela sair para não ter frio. E tudo bem. O cordão já tinha parado de pulsar e também eu comecei a tremer.

Depois de cortarem o cordão (o André não quis porque lhe fazia impressão), ele saiu da piscina, secou-se e passaram-na para o colo dele.

Entretanto a Isabel percebeu que a placenta já se estaria a soltar.
Pedi-lhe um tempo.
Respirei, fiz força e puxei eu pelo cordão.
Saiu muito bem.
Pareceu me pequenina. O cordão era mais fininho que o do Simão.
Passei-a para a taça. Tenho uma foto ou duas a rir-me com a placenta na mão. Que felicidade! :P

Ajudaram-me a sair e secaram-me. Fui para a chaise longue do sofá a tremer. Puseram muitas toalhas para ficar mais quente.
Mas, quem mais me aqueceu foi ela. Estava tão quentinha vinda do colo do pai ;)

Depois ali ficamos um tempo.
As parteiras confirmaram que não estava a perder sangue e foram fazer os prints da placenta para a cozinha. Pareceu-me que se estavam a divertir com os trabalhos manuais :)

E eu a namorar com a minha bebé. Sossegadinhas, sem interferências.

Só mais tarde fizeram os registos e deram os pontos com anestesia local spray.
Sem picada.
Tinha lacerado um bocadinho para o rabo. Superficial, felizmente, e sem apanhar a porcaria das varizes.


Passado um bocado, pesaram e mediram a bebé e administraram a vitamina K enquanto ela estava a mamar. Só chorou mesmo ao sair da agulha.

Liguei para casa dos meus pais ainda a bebé estava a chorar.
Achei melhor fazer uma videochamada para o Simão nos ver e mostrar à minha mãe e irmã que tinha nascido. Em casa. E era uma menina. ;)


O Simão achou piada ela estar a chorar. Ficou todo eufórico.

A Isabel e a Inês começaram a arrumar tudo. Esvaziar a piscina e arrumar as toalhas sujas.

A minha mãe achou que estivéssemos sozinhos! Virei a câmara para as parteiras e ela ficou mais descansada.
Disse-lhes para virem quando quisessem. Estávamos tão bem…

Mais tarde, falamos com os pais do André. Primeiro, ele enviou umas mensagens e logo a seguir o pai dele fez uma publicação no facebook :P. Depois por telefone, o que deixou a mãe dele super confusa por eu "já" estar em casa :D
Eles vieram também conhecer a bebé e só depois de cá estarem é que perceberam que tinha sido cá em casa.

As parteiras foram embora umas 3 horas ou mais depois do parto. Ainda comeram e beberam café. Pelo menos a Isabel que não tinha almoçado. Não lhe demos tempo!!!
Eu também comi carne e arroz eram umas 17h. Que maravilha de começo de puerpério!  :D

Antes de saírem, estivemos a ver a lista de nomes mas não chegamos a conclusão nenhuma e vimos também o vídeo do momento do nascimento. Nesse preciso momento, a bebé começou a chorar! Super sensitiva. Tive que lhe dizer que a mamã estava bem, mas imaginava que a ela lhe tivesse doído...

Depois de saírem e antes de chegar a minha irmã, mãe e Simão, conversámos os dois.
Disse ao André para ser ele a decidir o nome.
Achei que merecia.
Ele apoiou-me para além de qualquer expectativa!...

Tinha de ser ele a escolher o nome.

Ele consultou novamente a minha lista com as duas colunas: menino ou menina.

E daí ficou Inês.


Inês
Parto natural, em casa
27.06.2020    15h17