Editado a 15/01 para acrescentar as fotos da lentinha... ;)
Decidi inscrever-me em Dezembro, após os 18kms dos Picos do Açor.
Adorei a experiência de voltar a correr "fora de casa", desfrutar dos trilhos sem pensar em competir!
Tinha de repetir e, desta vez superar-me, sair novamente da "zona de conforto" de provas abaixo dos 20kms...
Natal e Passagem de Ano já foram, chega a primeira semana do ano bem intensa, entre trabalho e cenas da vida que me roubaram alguma energia, mas que me deram ainda mais vontade de cumprir este desafio até ao fim. 💪
Sabia que as previsões meteorológicas para o fim de semana não eram agradáveis, mas o som da chuva a cair lá fora, adiou por uns minutos sair da cama... Até que saltei de debaixo dos lençóis, "Vamos lá aos Abutres 2!"
- "Inês, deixa a mamã vestir-te. Vais para casa da avó, que eu vou correr!
- Não, não, não!
- Sim, sim, que eu gosto de correr!
- Não, a mamã gosta da Inês e do Simão!
- Sim, a mamã gosta muito de vocês, mas também gosta de correr" 😉
Fui até Sever com este pensamento e a ele voltei durante alguns momentos mais desafiantes: "Estou aqui porque gosto!", "Ninguém me obrigou!", "Está a ser divertido!", "Sorri!"
A chuva não parou um segundo que fosse durante as quase 4h da minha prova, nem sequer antes do arranque, pelo que optei por fazer o controlo 0, o mais tarde possível.
Antes disso, tentei perceber o percurso, de modo a que o André pudesse ver-me a passar em algum ponto, mas sem qualquer expectativa de o voltar a ver antes de chegar à meta. Não havia quaisquer condições para ele tirar fotos, nem estar parado (minimamente seco) à espera de alguém a passar...
Só para chegar ao secretariado já tinha ficado toda molhada!
Enfim. Siga, sem reclamar!
Após pouco mais de 1km de estrada a subir, ainda dentro de Sever do Vouga, não tardou a entrarmos nos trilhos completamente encharcados, enlameados e bem espezinhados pelas centenas de atletas da Ultra e dos 35kms... Pois...
A chuva constante, humidade intensa (calculada por mim, de 99% 😝 - só porque conseguia respirar fora de água trrrr), lama um pouco acima de q.b, água a jorrar por todos os cantos fez-me logo relembrar os primeiros kms dos Abutres. Precisamos também de atravessar uns poucos riachos, com àgua pelos joelhos, mas 'tá-se bem.
Estava a ser mesmo divertido!
Até porque nunca caí (que feito!) e, felizmente, não assisti a nenhuma queda aparatosa.
Agora sim, estava a conhecer Sever como deve ser... E a reconhecer alguns locais por onde já tinha passado, noutras andanças 😎
Fiquei de queixo caído ao passar a Cascata da Cabreia!
Nunca imaginei que estivesse com toda aquela pujança! Realmente impressionante! Linda! E já a meter o seu respeito...
Cheguei ao primeiro abastecimento, aos 8kms, de sorriso nos lábios. Mais do que uma pessoa me perguntou se eu estava contente. "Então não havia de estar?!"
Mas a força bruta da natureza veio a revelar-se um pouco mais à frente.
Algures no km 11, o ribeiro tinha-se transformado num rio e não havia ponte ou corda onde me agarrar...
"Ora bem, eu com pouco mais de 5okgs devo ir por aqui abaixo!"
Felizmente, tememos todos o mesmo. A rapariga que, pouco antes, me tinha ultrapassado, parou, esperou uns segundos por mim, demos as mãos e ela também deu a mão a outros 2 que estavam à nossa frente. Ficamos ali, 4 pessoas agarradas umas às outras, passinho a passinho até chegar à outra margem. Com imensa ajuda de um senhor que ficou parado, dentro de água, próximo à margem do outro lado, para nos ajudar a progredir.
Não cheguei a perceber se era atleta ou da organização, suponho que seja a última hipótese. Mas mal saí da água a tremer com a adrenalina, senti medo... Medo mesmo, do género, "podia ter morrido... Gosto disto mas não foi para isto que eu vim!" E a pensar naquele senhor que ficou para trás, dentro de água, a ajudar outros atletas...
Obriguei-me a continuar, a pedir para não voltar a passar por um desafio assim. O trilho continuou sempre junto à água (quer dizer, a prova toda foi com água por perto, ao lado, por cima, por baixo!!!). Chovia imenso e, no entanto, fiquei com a ideia de ter sido a prova em que mais líquidos bebi.
Uns 500 metros à frente, voltamos a passar numa zona perigosa, nova travessia de rio. Desta vez mais estreita e com ajuda de um membro da organização que estava agarrado a uma árvore com uma das mãos, um pé dentro de água e a outra mão firme que nos ajudava a passar para cima de uma espécie de ponte, que mal se via, por debaixo da água a correr super rápido...
Nova quebra emocional... E se o rapaz não estivesse ali? Caramba. Isto está de mais!
Uns metros à frente, já a subir, cruzei-me com outro voluntário que ia com um saco grande na mão. Finalmente iam colocar alguma coisa para tornar aquelas travessias mais seguras!
(soube, quando já estava em casa, que um rapaz terá ido arrastado pela água uns metros, mas que se conseguiu agarrar a um tronco e safou-se! 😱)
Ok.. Ribeiros e rios já temos que chegue. Falta a subida. Será que é desta que acaba a água?
Não, Daniela. Esquece lá isso.
Todos os trilhos tinham lama ou água com fartura, a terra não aguentava nem mais uma gota e não parava de chover! Os socalcos do terreno eram pequenas quedas de água, nas zonas mais planas formaram-se poças gigantes e mesmo os estradões, que cruzamos, estavam transformados em "rios".
Ainda fui passada pela Isabel, minha companhia nos Picos do Açor, sempre deu um pouco de ânimo ver uma cara conhecida. Ia cheia de energia, eu nem por isso...
A subida pareceu interminável... Nem é que tivesse uma inclinação impossível, mas...
Não sentia muito frio, tinha tirado o capuz há imenso tempo, ia apenas com o buff a fazer de bandolete, casaco "impermeável" completamente encharcado mas sempre fechadinho, mãos brancas e inchadas, luvas nos bolsos da frente do casaco todas molhadas, era indiferente tentar colocá-las nessa altura...
O vento ia aumentando à medida que subia e estar, constantemente, a meter os pés da água já se estava a tornar um massacre!
Ainda parei uns segundos, sentada num posto de transformação. Precisava de uma pausa, mas teve de ser muito breve, não podia deixar-me arrefecer.
"Enquanto não chegar lá acima, a água não vai parar", pensei.
Acabei por dizer isto em voz alta, para o rapaz que ia ao meu lado há uns metros. Ele acenou com a cabeça.
A primeira metade da prova foi, praticamente, o tempo todo assim, em silêncio. Virada para os meus pensamentos. Os trilhos e a serra a imporem todo o respeito e cuidado.
Fui gerindo a minha energia com pequenos goles de isotónico, uma barrita, que mastiguei imenso tempo e, mais tarde, um gel. Não repeti o erro do Açor. Parei e comi nos 2 abastecimentos. Sem comer/beber não ia aguentar este desafio...
Um bom pedaço depois de passarmos uma placa a dizer "Rota da Água e da Pedra" chegámos, finalmente, à parte mais alta! Chuva a bater tipo facas na cara, bora correr pelo estradão abaixo. E que bem que soube aquele pedaço de descida! Fiquei mais quente, ganhei outro ânimo!
Volta e meia via fitas pelo chão, não resistiram aos elementos... Houve um local ou outro em que fiquei na dúvida em relação ao percurso mas nada que levasse a me perder. Nessa altura já ia mais ou menos a par com as mesmas pessoas, que tenha conhecimento dos nomes, os Antónios e a Nádia, com as meias F*ck Covid 😁
A chegada ao segundo abastecimento desde o início da descida acabou por ser rápida e soube tão bem parar e comer, ainda que o local fosse frio e sem grande abrigo para a chuva que vinha de todos os lados... Nova receita: marmelada com sal 😖
Certo, faltam 8kms, as minhas costas ainda se estão a aguentar bem, "já não há-de ser nada!", vamos ao resto!
Mantive-me perto dos mesmos até ao final e acabei por passar algum tempo a conversar com a Nádia e com um dos Antónios. Os temas começaram pela nossa naturalidade, as provas que já fizemos e, entretanto, dei por mim já a falar sobre o meu trabalho. Pronto, quem me conhece sabe que esse tema dá pano para mangas... 😜
O que é certo é que os kms passaram e mal dei por eles, as subidas faziam-se mais a caminhar que a tentar manter o trote, fui passada por várias pessoas nestes últimos kms, mas não dei importância, não dava para muito mais. Ainda assim, sempre que podia, corria. Já era hora de terminar!
Mal conseguia ver o que dizia no meu relógio, tinha apontado para mais de 3h de prova e já ia perto das 4h... 😬
Como era de esperar, não vi o André toda a prova. Também mal vi os fotógrafos debaixo de umas capas pretas (nem eles me viram a mim, né? fotos com aquela chuva?...).
Travessia de estrada mais larga... Já estamos na civilização, está a acabar!
Ainda voltei a passar o António das cãibras, a Nádia, idem-aspas, incentivei-os a seguirem.
Comecei a ouvir o microfone e mantive o ritmo, já sozinha pelo parque da cidade.
Na pequena rampa até à meta, qual campeã (toda molhada a parecer um pito 😅), tirei finalmente o casaco e a mochila: há que mostrar as cores do clube a chegar à meta!
Tá feita!!! 💪
E estou viva!
Cumpri o desafio "pintado de verde" e também de castanho-pantone-laminha 😅
Cheia de frio, mas viva 😁
Mais uma prova para a história...
Qual será a próxima?!?
P.S.: Tal foi a aventura que me deu vontade de ressuscitar este blogue ao fim de uns 3 anos. Só para acrescentar que enquanto me lembrar da trabalheira que dá escrever aqui, não volto aqui, ok? Até à próxima!!! 😅
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